Em meados de setembro, o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP) recebeu uma proposta de protocolo a ser assinado com a Agência de Integração, Migração e Asilo (AIMA), segundo a qual as instituições de ensino superior (IES) seriam responsáveis por “coletar, analisar e enviar a documentação necessária” para emitir vistos e autorizações de residência para estudantes, professores e pesquisadores estrangeiros.
As instituições seriam obrigadas a coletar “dados pessoais”, como endereços ou números de telefone, e enviá-los para a AIMA, de acordo com a proposta de colaboração vista pela Lusa.
As instituições de ensino superior também seriam obrigadas a enviar todos os documentos necessários para processar os pedidos de autorização ou visto e deveriam primeiro “certificar a veracidade e a confiabilidade” desses documentos.
O texto do protocolo atribui onze obrigações às instituições, que também teriam que “fazer todos os esforços” para garantir que os candidatos estejam presentes nas agências da AIMA e até mesmo “fornecer o máximo de aviso prévio possível” se não pudessem comparecer.
Preocupações
A proposta foi submetida ao CRUP, que, em uma primeira reunião, levantou “algumas preocupações”.
O assunto está agora nas mãos da Comissão de Internacionalização do CRUP, que comentará e apresentará sugestões, disse à Lusa Paulo Jorge Ferreira, presidente do conselho de reitores.
“Há sérios problemas aqui a serem superados. Estamos pedindo que informações pessoais e confidenciais de estudantes, professores e pesquisadores sejam compartilhadas ou repassadas a terceiros”, alertou Paulo Jorge Ferreira, questionando “a legitimidade e a estrutura legal que permite às instituições repassar
informações pessoais”.Verificar a autenticidade dos documentos pode ser outro problema: “Não cabe às universidades verificar a legalidade dos documentos”.
“As universidades não são agências policiais, nem têm pessoal treinado para realizar esse tipo de verificação”, acrescentou, observando que funcionários adicionais precisariam ser contratados para operacionalizar o modelo proposto.
Além disso, as instituições também teriam que desenvolver uma série de outras atividades e tarefas, como promover iniciativas para divulgar a lei sobre estrangeiros ou garantir a participação das partes interessadas nas sessões de treinamento da AIMA.
Paulo Jorge Ferreira enfatizou que “o protocolo é opcional e só quem quiser aderir pode aderir”, mas o Orçamento do Estado cobre apenas cerca de 72% dos custos de recursos humanos, o que significa que a proposta pioraria ainda mais a situação financeira das instituições.
Apesar das críticas, o presidente do CRUP reconheceu que “a proposta é muito bem-intencionada”, pois busca resolver um problema vivenciado pelas IES portuguesas, que estão recebendo cada vez mais estudantes internacionais.
Os estudantes internacionais já representam cerca de 5% de todos os estudantes do ensino superior em Portugal.
“A chegada de talentos estrangeiros ao país é muito bem-vinda, e um dos obstáculos é justamente a carga burocrática de legalizar a situação dos estudantes em nosso país. As dificuldades em legalizar seu status desencorajam os estudantes de entrar em contato conosco, e isso é um obstáculo à internacionalização”, disse ele.
Portanto, o CRUP convidará a AIMA para uma reunião no final deste mês para discutir o protocolo e apresentar algumas propostas.
“Sobrecarga” de trabalho
Para o reitor da Universidade de Aveiro, a solução para o problema não pode ser “sobrecarregar as IES com mais tarefas”.
Como alternativa, Paulo Jorge Ferreira relembrou uma medida já em vigor em sua universidade, que em 2019 acolheu um Centro Local de Apoio à Integração de Migrantes (CLAIM) para apoiar sua comunidade internacional e “aliviar os CLAIMs locais da carga que a universidade estava causando”.
Na opinião do reitor, as IES poderiam fornecer espaço em seus campi para prestar esse serviço, que “seria composto por funcionários da agência” ou treinados para essas tarefas: “Nós forneceríamos o espaço e eles forneceriam o serviço”.
ALusa contactou a presidente do Conselho Coordenador dos Institutos Técnicos Superiores, que disse ainda não ter recebido o documento, que também estabelece as mesmas obrigações para os institutos politécnicos.
A AIMA também foi contactada pela Lusa, mas ainda não respondeu.